Linfedema.Prevenção, diagnóstico e tratamento
Linfedema:
Uma das principais complicações decorrentes do tratamento para câncer de mama é o linfedema de membro superior. Isso não se deve somente por sua cronicidade, mas também pelos aspectos psicossociais envolvidos no seu aparecimento. Estudos demonstram que as mulheres que desenvolvem linfedema apresentam alterações psicológicas, sociais, sexuais e funcionais importantes quando comparadas com as mulheres submetidas ao tratamento para câncer de mama, mas que não desenvolvem o linfedema [1 - 4].
O linfedema pode ser definido como todo e qualquer acúmulo de líquido nos espaços intersticiais, sendo este altamente protéico. Ocorre como resultado de uma deficiência mecânica na dinâmica do sistema linfático, reduzindo assim a sua capacidade no transporte da linfa. A sua instalação se dá após a exaustão de todos os artifícios de compensação, sendo eles: circulação colateral; dilatação linfática; neo-anastomoses linfo-linfáticas ou linfo-venosas; aumento da capacidade de transporte; e aumento de metabolismo celular, seja pela pinocitose ou proteólise [5].
Algumas complicações podem ocorrer devido ao linfedema, entre elas podemos citar: erisipela, fístulas linfáticas, alterações de pele (micoses, eczema e queratoses), papilomatoses dermatológicas, angioma (síndrome pseudo-Karposi) e angiosarcoma.
A prreviewência do linfedema tem variado de 9 a 40% entre os estudos realizados, dependendo do tempo de seguimento, da classificação e dos critérios utilizados para a definição de caso [6 - 14].
Diagnóstico:
Vários métodos vêm sendo empregados para diagnosticar e mensurar o linfedema, desde os mais simples, como a perimetria, até as mais complexas e sofisticadas técnicas de imagem. Cada qual apresenta vantagens e desvantagens. Segundo o consenso realizado pela Sociedade Internacional de Linfologia [15], o exame clínico é suficiente na maioria dos casos e as técnicas mais sofisticadas devem ser reservadas para casos especiais.
Os sinais e sintomas clínicos do linfedema são: edema na extremidade afetada, sinal de cacifo no estágio inicial e ausência nos estágios tardios, coloração da pele normal ou pálida, sinal de Stemmer positivo (prega cutânea), edema no dorso da mão, depressão na prega cutânea do punho, mudança na textura e na consistência da pele, papilomatose dermatológica, linfofistulas, entre outros [5, 16].
As mulheres com linfedema costumam relatar sintomas subjetivos como sensação de aumento de peso e edema no membro, aumento da tensão na pele e diminuição da flexibilidade na mão, cotovelo ou ombro [17].
Entre as técnicas objetivas usadas na quantificação do linfedema, o volume do membro é o que apresenta melhores resultados, tanto na validade como na confiabilidade dos dados obtidos. O volume pode ser verificado diretamente, através da imersão do membro em um recipiente milimetrado ou de forma indireta, estimada a partir de várias medidas de circunferência (em distâncias padrões) tratando cada segmento do membro como um par de circunferências (cone truncado) [18]. Outra técnica objetiva utilizada é através da circunferência realizada em vários pontos do membro, normalmente a cada 5 ou 10 centímetros, a partir do olécrano. Essa técnica é a utilizada, por ser mais rápida, prática e de fácil execução. Entretanto, é de pouca repetibilidade, devendo ser feita sempre pelo mesmo observador.
As técnicas de imagens podem ser necessárias para: excluir processos malignos, determinar o status vascular, diagnosticar precocemente o linfedema, obter um diagnóstico diferencial, determinar a melhor conduta terapêutica e verificar a eficácia dos tratamentos para linfedema. Entre as várias técnicas utilizadas, podemos citar: linfocintigrafia, análise múltipla da freqüência da impedância bioelétrica (MFBIA), tonometria tecidual, ressonância magnética, tomografia computadorizada e a ultra-sonografia.
Quando o diagnóstico é realizado precocemente, o tratamento responde melhor. O edema estagnado, rico em proteínas, serve como um excelente meio para o desenvolvimento de bactérias, predispondo o membro a inflamações e infecções. A resposta inflamatória aumenta o movimento dos fluidos dos capilares para os tecidos circundantes, congestionando assim os capilares linfáticos, fazendo com que o transporte dos fluidos se torne mais difícil, piorando o linfedema [19]. Assim sendo, os sinais e sintomas iniciais não devem ser ignorados e a terapêutica apropriada deve ser iniciada o mais precoce possível.
Classificação:
O linfedema pode ser classificado quanto a causa, cronicidade, topografia ou segundo sua intensidade, sendo este o mais comumente utilizado. É estratificado como:
• fase I: aqueles edemas que se desenvolvem após atividades físicas ou ao final do dia e melhoram espontaneamente ao repouso e aos estímulos linfáticos. Ocorre um pequeno aumento de linfa intersticial e alguma estase nos vasos linfáticos;
• fase II: são espontaneamente irreversíveis, mas que podem ser controlados com terapêuticas apropriadas. Possuem fibrose do fluido intersticial em algumas áreas e conseqüentemente, aumento da consistência da pele. O fluxo linfático se apresenta mais lento, havendo certo grau de estagnação da linfa em coletores e capilares.
• fase III: são irreversíveis e mais graves. Apresentam grau elevado de fibrose linfostática com grande estagnação da linfa nos vasos e capilares. Possuem alterações de pele importantes, tornando-se vulneráveis a erisipelas, eczemas, papilomatoses e fistulas linfáticas;
• fase IV: são as chamadas elefantíases, são irreversíveis com complicações como papilomatose, queratoses, fistulas linfáticas e angiomas. Traduz a total falência dos vasos linfáticos [5, 20].
Fatores de risco:
Vários fatores vêm sendo considerados de risco para o desenvolvimento de linfedema após o tratamento para câncer de mama. A cirurgia axilar, a radioterapia e a associação de ambos é o fator mais fortemente envolvido. Outras variáveis como idade, obesidade, hipertensão arterial, técnica cirúrgica realizada na mama, diminuição da amplitude articular, falta de orientações pós operatórias, linfonodos comprometidos, localização do tumor, estadiamento tumoral, entre outros vem sendo divulgados em estudos, porém continuam inconclusivos [6, 8, 21, 22, 23, 24, 25 ].
As infecções no membro superiores foram bastante relacionadas com o desenvolvimento do linfedema, entretanto, pode ser que não seja um fator desencadeante, mas sim ser decorrente do linfedema muitas vezes subclínico [16, 26, 27].
Prevenção do linfedema após tratamento para câncer de mama:
A prevenção do linfedema pode ser conseguida através de uma série de cuidados, que iniciam a partir do diagnóstico de câncer de mama. As cirurgias devem ser o mais conservadoras possíveis, e o linfonodo sentinela pode representar um importante aliado na diminuição do linfedema. A radioterapia axilar deve ser restrita a casos em que há um extenso comprometimento axilar, sendo a dose limitada a 45 - 50 Gy [28].
Após o tratamento cirúrgico, as pacientes devem ser orientadas sobre os cuidados com a pele e o membro superior homolateral ao câncer de mama, a fim de evitar possíveis traumas e ferimentos, entretanto, os cuidados devem ser passados de forma bastante tranqüila para que não haja um sentimento de incapacidade e impotência física. As orientações com relação à vida doméstica, profissional e de lazer devem ser direcionadas as suas rotinas e condutas alternativas devem ser ensinadas quando forem realmente necessárias. Alguns estudos vem sendo publicados questionando a validade dos atuais "manuais" de orientações para prevenção do linfedema, pois acreditam que, apesar da plausibilidade biológica, nenhuma evidência foi demonstrada sobre a validade destes cuidados [16, 29]. Sendo assim, acreditamos que os cuidados com o membro precisam ser tomados, porém eles não podem afetar e prejudicar a rotina de vida destas mulheres.
Os exercícios devem ser iniciados precocemente, sendo que até a terceira semana pós-operatória, limitados a 90º na flexão e abdução do membro superior afetado para evitar complicações cicatriciais. A inclusão em um programa fisioterápico deve ser recomendada o mais precoce possível. A auto-massagem linfática deverá ser ensinada, visando melhorar as vias secundárias de drenagem da linfa [20].
As pacientes obesas devem ser incentivadas a restringir o peso corporal [28].
Os recursos fisioterápicos que provocam calor superficial e profundo (ondas curtas, micro-ondas, infravermelho, turbilhão, forno de Bier) não devem ser utilizados no lado afetado, pois favorecem a ultrafiltração arterial para o interstício podendo desencadear o linfedema [20].
As mulheres devem ter conhecimento sobre os sinais e sintomas iniciais dos processos infecciosos e do linfedema, para que comuniquem o médico assistente e uma correta conduta terapêutica seja implantada. A equipe de saúde deve estar preparada para diagnosticar e intervir precocemente.
Tratamento do Linfedema
O tratamento do linfedema está baseado em técnicas já bem aceitas e descritas na literatura mundial, conhecida como CPT (Complex Physical Therapy), sendo que no Brasil é chamada de TFC (Tratamento Físico Complexo) ou Linfoterapia. Este tratamento consiste de várias técnicas que atuam conjuntamente, dependendo da fase em que se encontra o linfedema, incluindo: cuidados com a pele, drenagem linfática manual (DLM), contenção na forma de enfaixamento ou por luvas/braçadeiras e cinesioterapia específica. O tratamento é dividido em duas fases, sendo que na primeira o objetivo é a redução do volume do membro, tendo a duração de 2 a 6 semanas, e a segunda é a fase de manutenção e controle do linfedema [30].
Os cuidados com a pele devem ser realizados durante todo o tratamento. A pele deve ser avaliada com relação a sua hidratação, dermatite e processos inflamatórios e infecciosos e, quando necessário, o tratamento adequado deve ser empregado anterior ou concomitante ao TFC.
A drenagem linfática manual tem como objetivo favorecer as vias secundárias de drenagem linfática através de anastomoses linfo-linfáticas superficiais e também remover as áreas de fibrose dos tecidos acometidos. São contra-indicados nos casos de processos inflamatórios/ infecciosos agudos e em tromboses agudas. Nos casos de insuficiência cardíaca, obstrução da veia cava superior, inflamações crônicas, disfunções da tireóide, história de tromboses e câncer avançado a DLM pode ser realizada com bastante cautela [31]. Na primeira fase a DLM é realizada pelo fisioterapeuta, e após o término desta fase, a auto-massagem é ensinada a fim de estimular as anastomoses áxilo-axilares e áxilo-inguinais [20].
O enfaixamento compressivo é de extrema importância durante a primeira fase do tratamento do linfedema, pois ao promover um suporte externo na pele, leva a um aumento da pressão intersticial com redução da ultrafiltração, melhora a eficácia do bombeamento muscular levando a um aumento do fluxo venoso e linfático e não permite o refluxo causado pela insuficiência valvular. São contra-indicados na existência de infecções, arteriopatia, grandes alterações de sensibilidade e na hipertensão arterial grave [20]. O enfaixamento é mantido até a próxima sessão fisioterápica. Na segunda fase de tratamento, o enfaixamento é substituído pelo uso de contenção elástica (braçadeiras / luvas), preferencialmente feita sob medida, devendo seu uso ser constante.
A cinesioterapia deve ser realizada com o membro enfaixado, na primeira fase, e com o uso de contenção elástica, na segunda fase de tratamento. Ela promove um aumento do fluxo linfático assim como favorece a reabsorção de proteínas. A combinação de exercícios de flexibilidade, treinamento aeróbico e alongamentos associados aos outros recursos do TFC, tem apresentado melhores resultados. Os portadores de patologias cardíacas e pulmonares apresentam contra-indicação relativa a prática de exercícios [32].
Outros tratamentos têm sido descritos na literatura, porém seus resultados não são satisfatórios quando comparados ao TFC. Entre eles podemos citar:
• Bomba pneumática: já foi bastante utilizada, entretanto, atualmente, a sua indicação é muito restrita, e quando indicada deve ser realizada a DLM antes a após o seu uso, obrigatoriamente, e com pressão máxima de 40 mm Hg [33]. O seu uso exclusivo deve ser evitado [16]. Entretanto, mesmo seguindo esses princípios, vários autores condenam o seu uso por diversas razões: o bombeamento não favorece a evacuação dos fluidos na região superior do membro afetado, e sim a congestiona; não são válidas nos tratamentos do linfedema na fase II e III, devido a presença de fibrose e cicatriz tecidual; traumatizam e danificam os vasos linfáticos superficiais, favorecendo a formação de fibroses linfáticas; pode levar a formação de linfedema nas regiões adjacentes; caso não haja uma compressão do membro entre as sessões, o edema retorna de forma pior; pode provocar fístulas na conexão proximal da bomba, favorecendo a entrada de bactérias, provocando processos inflamatórios e infecciosos; entre outros [34, 35]. Os resultados de estudos que usam as bombas pneumáticas são discutíveis. A divulgação dos problemas causados pelo seu uso inadequado devem ser propagadas, a fim de obtermos melhores resultados no tratamento do linfedema.
• Elevação do membro: são eficazes somente nos linfedemas iniciais (fase I). Nos outros casos não apresentam resultados e causam inconveniências aos pacientes [35, 36]. Segundo Brennan [32], a elevação pode ser utilizada eventualmente como adjuvante, mas não é considerada essencial no tratamento do linfedema.
• Benzopironas: o tratamento com Benzopirona (Coumarin) tem sido sugerido como adjuvante ao TFC, e o seu uso isolado não tem sido indicado [15]. Tem como função: aumento do fluxo linfático ao melhorar a capacidade de bombeamento dos coletores linfáticos; aumentar a resistência e diminuir a hiperpermeabilidade capilar, resultando na diminuição de perda de proteínas dos vasos sanguíneos; e estimulo da atividade proteolítica dos macrófagos, resultando em mais fagocitoses de proteínas nos tecidos [37]. O seu uso oral não foi aprovado pelo FDA nos EUA, e na Austrália, o uso foi suspenso devido à alta toxidade hepática [38].
• Diuréticos: não são utilizados de rotina no tratamento para linfedema, pois ao eliminarem a água, concentram proteínas nos tecidos aumentando as áreas de fibrose, dificultando a absorção linfática [35].
• Dietas: nenhuma dieta em especial é útil no tratamento do linfedema. Em pacientes obesas, o controle alimentar associado a um programa de exercícios pode ter algum valor na diminuição do volume do membro. O consumo de proteínas não precisa ser restringido [15].
• Tratamentos cirúrgicos: São reservados aos casos em que não respondem ao TFC ou como adjuvantes. Pode ser feita uma ressecção, consistindo na remoção do excesso de pele e tecido subcutâneo do membro linfedematoso, sendo sua maior desvantagem a remoção e danificação dos vasos linfáticos colaterais, que acabam por interferir posteriormente no TFC. A lipoaspiração ou cirurgias que requerem uma extensiva dissecção de pele são contra-indicadas. Os procedimentos microcirúrgicos tem como objetivo aumentar o retorno da linfa para a circulação sanguínea, podendo ser através de métodos reconstrutores, que envolvem o uso de um coletor linfático ou uma interposição de um segmento venoso para restaurar a continuidade linfática, ou através ainda de métodos derivativos , que tem como objetivo desviar o fluxo linfático para o sistema venoso [15].
• Reabilitação psicossocial: o suporte psico-social é um importante aliado na melhora da qualidade de vida dos pacientes com linfedema.
PESTO BREAD
Há 6 anos
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